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“Só sei que nada sei”. Sei não!

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No texto anterior, “a cereja no bolo do boçal”, questionei a palavra boçal. Como eu disse, associar africanos recém-chegados ao Brasil – e que ainda não falavam português – a ignorante, rude, tosco, desprovido de inteligência é um ato colonialista e racista. Frente a língua que se apresentava, estes escravos poderiam dizer, assim como Sócrates: “Só sei que nada sei”.

Isto é fácil e patente, pois é possível perceber os limites do conhecimento e ter discernimento para reconhecer a ignorância.

Todavia, quando penso em ignorância stricto sensu, estou pensando um pouco mais além, ou aquém.

A famosa frase de Sócrates também revela um momento da ciência pré-moderna. Pois, saber que não se sabe supõe determinado conhecimento, que permite discernir a ignorância, o não-saber.

Todavia, não é assim que o mundo se apresenta.

Gosto de pensar em Flogisto.
Para explicar a combustão, Georg Stahl (1660-1734) afirmava que os corpos possuiriam uma matéria chamada Flogisto, que seria liberada ao ar durante os processos de combustão (Wikipédia explica melhor). Esta teoria perdurou durante anos, até que Lavoisier, em 1789, descobriu o oxigênio. Assim, não haveria essa substância liberada no ar, mas processo de combustão pelo oxigênio.

Para isto, também podemos pensar em paradigmas. De acordo com Thomas Kuhn, a ciência cria modos de pensamento, estruturas de explicações, formas e processos de pesquisa que permitem o desenvolvimento do conhecimento, mas que também o limita. As diferentes formas podem ser chamadas de paradigmas. Ou seja: é o modo como pensamos e explicamos os fenômenos sociais e naturais.

Assim, quando a ciência estava dentro do paradigma do Flogisto, tudo era explicado de acordo com esta teoria. Até que um novo paradigma a superou, tornou-se passível de comprovação e, por meio do oxigênio, criou um novo modo de pensar e explicar, revelando uma nova verdade (por isto as verdades são conjecturais).

Neste caso, não estamos na esfera do ‘sei que nada sei’, mas, ao pensar em Flogisto estamos no reino do “não sei o que não sei”. O mundo se apresentava de modo equivocado e tentávamos explicá-lo por meio de uma teoria que estava errada. E neste movimento, somos ignorantes stricto sensu, pois não sabemos o que não sabemos.
A frase de Sócrates é cientificamente arcaica (e politicamente contemporânea), pois ela expressa uma ilusão do discernimento, uma ilusão do conhecimento sobre a ignorância. Como se pudéssemos ter certeza de saber o que não sabemos.

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